Conhecido por colaborar e escrever novelas de grande repercussão na Record TV, Emilio Boechat viu seu nome envolvido em uma polêmica com ex-autores da casa. Eles estariam processando a emissora na Justiça por uma suposta pressão para se converter a Igreja Universal.
Ao longo dos últimos anos, inúmeras manchetes de vários veículos de comunicação, apontam problemas nos bastidores da dramaturgia do canal. Supostas divergências com a diretora Cristiane Cardoso, pressão, audiência e demissões são alguns dos assuntos que assombram a emissora.
Neste sentido, o dramaturgo conta em detalhes o que viveu nos últimos 14 anos de Record. Em conversa com editor e colunista Jefferson Oliveira, do Portal Alta Definição, o autor abre o coração, desmente algumas notícias, confessa que pediu para sair da Record TV e fala tudo o que pensa sobre a atual teledramaturgia do canal.
Grato aos 14 anos de Record
Emilio começa a conversa exaltando o tempo em que passou na Record, 14 anos no total. Ele comemora o fato de ter trabalhado com autores renomados e relembra que várias novelas chegaram à liderança na audiência
Foi um período muito profícuo, onde aprendi muito e trabalhei com autores do peso, de uma Ana Maria Moretzshon e de um Carlos Lombardi. Foi um período maravilhoso porque a Record apostava em produtos ousados e dava total liberdade aos seus autores. A audiência era alta e muitas vezes ameaçava a Globo. Mesmo que se discuta a qualidade de novelas como Mutantes, muitas delas mudaram paradigmas das novelas nacionais como Vidas Opostas, a primeira novela gravada em uma favela.
O escritor também confirma que teve muito espaço no canal. Para ele, a emissora causou uma revolução até dentro da Globo.
Sou muito grato pelo tempo em que trabalhei na Record. A emissora abriu um mercado importante e revelou novos autores, coisa que era impensada na época em que a Globo era hegemônica e não dava espaço para o surgimento de novos nomes na teledramaturgia. Isso só aconteceu depois do surgimento com força da dramaturgia da Record.
Ele conta ainda que a pressão por audiência sempre existiu, mas foi após a 1ª temporada de Os Dez Mandamentos que surgiu um outro tipo de pressão. E revela que mesmo assim, “a autora Vivian de Oliveira, conseguiu impor o seu ponto de vista”.
A pressão nos bastidores
Boechat conta que após o sucesso de Os Dez Mandamentos (2015), os autores não ‘ditavam mais os rumos da história’: “Era a emissora“, garante ele. Foi aí que começaram a debandada de renomados autores como Marcílio Moraes e Gisele Joras.
Muitos autores simplesmente se curvaram a essas imposições, enquanto autores mais consagrados decidiram deixar a emissora.
Liberdade para escrever
Na Record, Emílio assumiu pelo menos duas obras, que inicialmente não eram suas. Ele recorda que tanto em Rebelde (2012) quanto em Apocalipse (2018), teve total liberdade de criação. Mas, foi em Gênesis (2021) que tudo mudou.
Em Gênesis eu tive certa liberdade de criação no início. Mas a minha interpretação é que como a expectativa pela audiência da novela era muito alta, pressões de vários lados, pediam sempre mudanças nos rumos da história porque havia tempo para mudar. Quando eu interpretei que essas mudanças podiam a colocar em risco a minha reputação como autor, eu decidi sair.
Gênesis, o começo do fim
A última novela bíblica da Record TV, Gênesis, colecionou bons índices de audiência, mas também polêmicas nos bastidores. Entregue inicialmente a Gustavo Reiz (Escrava Mãe, Belaventura) o projeto passou para as mãos de Emilio Boechat. Naquela altura, Gustavo era mais um autor deixando a emissora.
Foi mais ou menos nessa época que me convidaram para escrever Gênesis. Fiquei feliz com o convite, mas relutei muito em aceitar porque já estava claro que eu não teria controle sobre a obra. Mas em conversas que mantive com a direção da emissora me pareceu que em linhas gerais estávamos alinhados.
Boechat diz que sofreu pressão “de todos os lados” e por isso pediu para deixar não só a novela, mas a emissora.
Mas como se tratava de uma novela muito importante para a Record, que vinha com audiência em queda, as pressões por mudanças surgiam de todos os lados. Em determinado momento, eu achei que deixar a novela e a emissora era o mais saudável para a minha carreira como autor.
O dramaturgo enfatiza ainda qual era o grande dilema nos bastidores das novelas bíblicas mais recentes.
Não era como se houvesse alguém ditando o que eu escrevia. Mas eu precisava respeitar a Bíblia, afinal, era uma adaptação. Mas ao mesmo tempo a Bíblia tem inúmeras interpretações e nem sempre existia um consenso sobre isso.
A saída da Record
Após tomar a decisão de não continuar no canal de Edir Macedo, Emilio conta que teve uma conversa com o Marcelo Silva, Vice-Presidente da Record, a quem elogia.
Conversei sobre isso com o sr. Marcelo Silva, com quem sempre mantive uma boa interlocução. Ele entendeu o meu ponto de vista e decidimos por uma rescisão amigável.
Se converteu a Universal?
Segundo matéria exclusiva do Notícias da TV, autores como Paula Richard (Novela Jesus), estariam processando a Record por pressão para se converter a Igreja Universal. Como é de conhecimento público, o dono da emissora é o Bipo Edir Macedo, líder da IURD. Contudo, Emilio afirma que nunca foi coagido para se tornar evangélico.
Em 14 anos de emissora, jamais sofri pressões para me tornar evangélico, ou para ingressar na IURD. Mas não posso falar por outros profissionais.
“Não me vejo voltando à Record”
Mesmo demostrando profunda gratidão pelo tempo em que passou na emissora, Emilio Boechat diz que não pretende voltar, uma vez que a atual proposta da teledramaturgia não lhe interessa.
Foi importante pra minha carreira ter trabalhado na Record, de outra forma provavelmente jamais teria escrito uma novela. E escrever novelas nos dá uma desenvoltura e agilidade que nenhum outro gênero é capaz. Mas creio que o meu tempo na emissora já se cumpriu. Não vejo por que eu voltaria pra lá. A proposta da teledramaturgia atual não me interessa. Procuro novos rumos pra minha vida e minha carreira e estou feliz com o caminho que estou construindo agora.
“O problema é a propaganda da religião”
Questionado sobre o que acha das novelas e séries bíblicas, o autor explica que a TV brasileira tem e deve ter espaço para tal. No entanto, ele critica a forma como estão sendo conduzidas: “uma propaganda dessa ou daquela religião.
As obras bíblicas sempre terão um grande apelo porque tratam de mitos e arquétipos milenares, que fazem parte do desenvolvimento da psique humana. É assim como eu vejo. Além de serem histórias épicas de grande apelo visual. O problema é quando essas obras viram instrumento de propaganda dessa ou daquela religião.
O autor ainda continua:
A Biblia continuará despertando o interesse e a curiosidade de um público amplo em busca de espiritualidade ou de uma fantasia épica que encante os olhos e transcende a realidade.
Um novo e encantador projeto
Longe das novelas desde 2021, Emilio Boechat agora se volta para o teatro. Em parceria com Marilia Toledo, ele escreveu o musical ‘Ney Matogrosso Homem com H’, a quem aponta como “um lindo presenta na carreira”.
A peça está estreando uma 4ª temporada de sucesso em São Paulo, com casa cheia além de colher críticas elogiosas. Agradeço ao convite da Marilia Toledo que escreveu o texto comigo, dirige e produz o espetáculo.
Muito feliz e realizado, o autor ainda revela que há previsão para a peça rodar o Brasil, contando a história de superação e luta contra o preconceito em outras capitais.
Estou curtindo muito essa minha volta ao teatro. É realmente o meio para o qual mais gosto de escrever.
Sobre seu retorno à telinha, o autor faz suspense.
Não abandonei o audiovisual. Tenho muitos projetos aguardando aprovação, mas por enquanto não posso adiantar muita coisa.