Vanessa Faro, jornalista e apresentadora, do ‘Tribuna Esporte’, da TV Tribuna, afiliada da Globo na Baixada Santista, retornou à TV em janeiro, após 3 meses afastada da emissora. Com grande história na TV, foi através do esporte que ela fez coberturas especiais para o canal como Olimpíadas de Pequim e Londres, Mundial de Judô em Paris dentre outros eventos internacionais.
No ar desde 2010 no ‘Tribuna Esporte’, Faro falou com exclusividade ao Portal Alta Definição sobre como foram os dias de luta contra o câncer de mama, o afastamento para realizar o tratamento, o carinho do público e o retorno a apresentação do esportivo.
Antes da licença médica, Vanessa Faro conta que foi muito emocionante seu último dia na apresentação do ‘Tribuna Esporte’. Na emissora, também apresentou o ‘Corpo em Ação’, que ia ao ar aos sábados na faixa da tarde. Antes de contar ao público, ao vivo, na TV, que iria se afastar para realizar o tratamento contra o câncer, ela teve uma longa jornada de exames e idas às consultas médicas.
A confirmação que estava doente a deixou com receio da reação dos colegas. Ela não queria ouvir que a vida estaria terminando ali, pelo contrário, era só mais uma batalha a ser enfrentada. O curioso foi que os colegas da redação, pensaram que fosse seu marido, Eduardo Silva, diretor de jornalismo da emissora, que estivesse doente, mas foi ele quem avisou os parceiros.
De vida ativa com a prática de muito esporte, esse momento difícil se transformou também em história de força, motivação e superação. A criação do perfil nas redes sociais, ‘Patricinha Casca Grossa’, foi a maneira em que ela encontrou para contar ao mundo sobre o que estava vivendo e principalmente ajudar muitas mulheres que passaram ou ainda estão passando por um momento tão difícil, mas não impossível. “Eu demorei muito pra contar para toda minha família e amigos. E toda vez que contava eu sofria. Então eu decidi contar de uma vez no Patricinha Casca Grossa”, conta.
Naquele momento, disse que sentiu medo, mas também uma força enorme ao falar para milhares de pessoas que estava com câncer. “Foi a coisa certa a fazer. Como jornalista, sempre fui muito transparente. Não poderia mentir para o meu público, para pessoas tão queridas”, escreveu.
Carinho, emoção e força
Gostaria que nos contasse como foi o seu último dia de apresentação no Tribuna Esporte, para iniciar o tratamento. O que você sentiu e o que pensou naquele dia antes de entrar no ar?
V: Foi muito emocionante. Na verdade, eu não sabia como iria reagir. Fiquei com medo de me emocionar muito na hora da apresentação, mas senti uma força tão grande ao meu lado. Senti uma energia enorme ao falar ao vivo na TV para milhares de pessoas que estava com câncer. Foi a coisa certa a fazer. Como jornalista, sempre fui muito transparente. Não poderia mentir para o meu público, para pessoas tão queridas. Senti que essa era a forma que Deus me deu de ajudar outras pessoas com a doença, com outras doenças, com outras dificuldades. Ao ajudar eu também estou me ajudando a colocar pra fora o “nó” que surgiu em meu peito. Claro que mil coisas passaram na minha cabeça. Várias perguntas! Seria meu último programa? Não pensei em morte na hora, mas em todo o tratamento. Quanto tempo eu iria demorar pra retornar. Se iriam querer que eu continuasse apresentando ou se eu ficaria careca. Se ficaria bem apresentando de peruca, etc.
Como foi a reação dos colegas na TV Tribuna?
V: Falar para as pessoas que você está com câncer é dificílimo. Só quem passa por isso realmente sabe. Difícil porque a gente fica com medo da reação das pessoas. Sério! A gente já está fragilizada, com medo e dá um pavor de como contar. Medo se a pessoa vai chorar, falar coitada (com aquela cara de que você já morreu), ficar em choque, etc. Eu demorei muito pra contar para toda minha família e amigos. E toda vez que contava eu sofria. Então eu decidi contar de uma vez no Patricinha Casca Grossa. Claro que para as pessoas mais próximas eu avisei antes. Na TV aconteceu uma situação engraçada. Meu marido trabalha comigo e todo mundo sabia que estávamos indo à vários médicos, mas achavam que ele é quem estava doente (risadas).
Foi ele que avisou o pessoal que eu é que estava com câncer. Como fiquei um dia ou dois sem ir à TV depois que eu soube do diagnóstico, assim que retornei ao trabalho, a maioria já sabia. Muitos vieram falar comigo, sem jeito. Outros ficaram sem saber como falar. Então eu fui logo quebrando o gelo e fui avisando que estava com câncer. A partir dai tudo ficou mais leve. Recebi muito carinho e força.
Diante disso, você tornou público um momento muito delicado da sua vida, mas o intuito foi de ajudar outras mulheres que também passam/passaram por isso, certo?
V: Quando eu recebi a notícia de que estava com câncer de mama um filme passou na minha cabeça. Minha mãe teve a mesma doença, lutou muito, sofreu com o tratamento e não resistiu. Faz dez anos que ela faleceu devido ao câncer. Até hoje é muito triste lembrar de todo o sofrimento. Por isso mesmo, eu determinei que minha história seria diferente. Por minha saudosa mãe, por mim, por minha filha, irmão e marido, eu senti uma necessidade enorme de compartilhar o que estava acontecendo comigo e ajudar outras mulheres que estão passando pela mesma situação. Uma forma de mostrar que elas não estão sozinhas nessa luta pela vida. Sei bem o quanto essa doença deixa a gente assustada e com a sensação de que estamos “sozinhas” nesse “pesadelo”.
O apoio da família, dos amigos, é fundamental e faz toda a diferença. Como uma figura pública, senti que dividir isso com outras pessoas, seria importantíssimo para incentivar e mostrar que existe vida após o diagnóstico de câncer.
Através do Patricinha Casca Grossa, você começou a compartilhar sua rotina de tratamento. Como foi o retorno das pessoas que te seguem e também daquelas que vivenciaram/vivenciam a mesma situação?
V: Está sendo incrível o retorno das pessoas. Muitas mulheres que estão em tratamento ou já passaram por isso, comentam, escrevem suas experiências. Virou um lugar de troca de informações, energia, força, suporte e amor. Também virou um lugar onde coloco pra fora tudo o que estou sentindo. É meu momento de terapia. Porém, como é um tema “pesado”, falo dos perrengues, mas falo com bom humor. Adoro rir de mim mesma! Não tenho vergonha de mostrar situações delicadas do tratamento. Desde um seio ficar maior do que outro, como foi a mastectomia, as cicatrizes, a busca por pijama pro hospital, os medos, os exames, etc. O interessante é que não só quem está com câncer, mas também seguem o ‘Patricinha Casca Grossa’ muitos familiares de quem está doente. Já recebi recado de muita filha desabafando e falando que não imaginava que a mãe com câncer poderia estar sentindo tal coisa, medo da morte, medo do tratamento, etc., afinal, toda a família “vive a doença”. Sinto que virou um “lugar” onde as pessoas se identificam e se sentem à vontade pra desabafar.
Durante o tratamento, qual momento você julga o mais difícil?
V: Tudo! A hora que a gente recebe a notícia muda totalmente o resto da nossa vida. É uma porrada! O começo é muito complicado pois a gente ainda não sabe o grau da gravidade. Se está ou não com metástase, qual a porcentagem de cura, qual o tratamento adequado? Foi muito complicado pra mim escolher o médico e tratamento. São muitas dúvidas e me senti perdida. Cada médico que ia sugeria um tipo diferente de tratamento. Mas todos falaram que meu nódulo já estava grande e teria que fazer a mastectomia total da mama esquerda. Teve um dia que eu surtei a caminho do trabalho. Eu estava com meu irmão e começou a bater um desespero, pois todo mundo ficava me perguntando e cobrando quando é que eu ia começar a me tratar e com qual médico. Lembro que gritei da boca pra fora que não queria saber de mais nenhum. Meu irmão então falou pra eu procurar uma terceira opinião. Foi o que fiz e deu certo. Por acaso, o último mastologista que fui o “santo bateu” comigo e com toda minha família (filha, irmão e marido). Um dia antes de ir pra sala de cirurgia também dá medo de não voltar. Mas no fundo eu sabia que tudo daria certo.
Durante esse período você apareceu nos jornalísticos da casa para divulgar a página e também explicar ao público o motivo do seu afastamento. Como foi o retorno do público da TV Tribuna?
V: Incrível! Recebi e recebo tanto amor, tanto carinho. São palavras de incentivo, recados de força e fé. Tem me ajudado tanto! É uma energia que transcende. Todo esse apoio faz muita diferença na recuperação. Recebo também recados de pessoas que não me seguiam antes e ao verem meu lado mais “humano” passaram a me seguir. Muitas dizem que passaram a admirar ainda mais meu trabalho e pessoa.
Numa entrevista que você me deu quando eu ainda estava na faculdade, em dezembro de 2017, você disse: “Eu não sei ficar sem trabalhar, eu não sei o que eu faria sem isso aqui, sinceramente. Ficaria perdida. Mas essa parte familiar é fundamental.” Qual foi a importância da sua família nesse momento, e você sentiu essa falta do trabalho?
Eles fazem a diferença na minha vida, na minha recuperação. A família pra mim é tudo. Decidi lutar, vencer devido a eles. Minha filha é meu grande amor. Por ela eu renasço. Como sofri com a morte da minha mãe, eu me agarrei na esperança de ficar curada pra não fazer minha filha sofrer e meu irmão sofrerem. Sei que não cabe a mim o destino, mas cabe a luta! A Bruna, meu marido e meu irmão são tudo pra mim. Todos me deram e dão força. Se não fossem eles, eu estaria em depressão. E o trabalho foi fundamental para seguir com a vida. Me faz bem pra não ficar pensando na doença. Pra mim, é muito importante me manter produtiva, com planos, etc. Fora que tenho grandes amigos aqui na TV Tribuna. Pessoas que me fazem muito bem e que adoro.
Na mesma entrevista você pontou: “Olha, quando a gente pensa que não podemos aprender mais nada nos damos conta que não sabemos de nada. Temos que aprender cada vez mais e temos que nos reinventar sempre (…)”. O que você aprendeu com tudo isso?
Mais do que nunca acredito no eterno aprendizado. Cada dia é uma lição, um novo olhar. Estou me redescobrindo! Sei que aqui é uma passagem… e como passa rápido, rápido demais. Percebi que dentro da trajetória de uma vida, existem várias vidas, vivencias distintas. Olho pra trás e percebo que vivi tantas histórias diferentes. Mas todas são a minha história. Aprendi que sou capaz, sou forte, mas que também preciso de colo, de ajuda, de carinho; que a vida é muito melhor ao lado de quem a gente ama e que nos ama. Aprendi a não me cobrar tanto, a relaxar, a deixar fluir, a ser mais grata, a acreditar cada dia mais no milagre da vida.
Você pensa em transformar o perfil dedicado a sua experiência com o câncer de mama em um projeto maior, ou até mesmo algo na TV Tribuna?
V: Eu estou com alguns projetos sim. Espero que o @PatricinhaCascaGrossa cresça cada vez mais para ajudar as pessoas. Espero fazer palestras, falar com essas mulheres. Além disso, eu e minha filha queremos criar uma marca para grande parte do lucro ser revertido para o bem, através do Pauta Solidária (projeto de ação social que faço parte com mais quatro amigos da faculdade). Estou bolando um outro projeto que surgiu devido ao câncer, com minha filha Bruna Faro e com a fotógrafa Vanessa Rodrigues. Assim que sair eu faço questão de divulgar. Vai ser lindo!
Não sei se você notou, mas as gafes que acontecem na TV, estão virando memes nas redes sociais. Você teme virar um meme ou lida isso com tranquilidade? Tem alguma gafe do passado que, com certeza, hoje seria um meme digno de estar no perfil, “Virei Jornalista“, por exemplo?
V: Uma vez fizeram um meme meu (risos). Era uma foto minha, fazendo o sinal de silêncio. Usaram essa foto pra brincar com o Santos (risos). Meu Deus eu tenho várias! Situações que pra muitas pessoas seriam constrangedoras, mas que graças ao meu bom humor, eu ri muito da situação. Tenho uma lista enorme!
Por fim, como foi o retorno ao trabalho, o que você espera daqui pra frente e qual a mensagem você deixa para todas as mulheres?
V: Confesso que retornei ao trabalho com medo da Covid-19. Ainda tenho medo! Mas tomo “banho” de álcool em gel (risos). Se eu estivesse fazendo quimioterapia creio que não retornaria à redação. Seria muito arriscado devido a pandemia e a baixa imunidade. Como estou fazendo hormonioterapia, minha imunidade não está baixa como se fosse na quimio. Então o trabalho está me fazendo muito bem. Eu espero continuar forte, confiante e que alcance a cura. Ainda tenho um longo caminho pela frente de tratamento. Vão ser no mínimo cinco anos tomando medicação. Espero manter o bom humor, ser um exemplo positivo de superação e cura para outras mulheres. Que minha voz, através do meu trabalho e do Patricinha Casca Grossa, continue a inspirar.
A mensagem que deixo é cuide-se, permita-se, chore, grite, ria de você mesma, sorria pra vida! Vão ter dias sombrios, mas você é forte, você tem a vida em você. O câncer tem cura sim! Eu já vi milagres acontecerem ao meu redor. Aproveite sua família, amigos, bichos. Não deixe pra depois o que tem vontade de aprender, de fazer. Acredite em você! Pois tenha certeza que você é especial e merece ser feliz.
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